Clóvis Dottori

Projeto Andrews 90 anos

Entrevista com Clóvis Dottori

Rio de Janeiro, 20 de junho de 2007

Entrevistadora Regina Hippolito 

 

Onde e quando nasceu?

 

CD: Nasci em Teixeiras, uma pequena cidade próxima a Viçosa, no interior de Minas Gerais. Vim para o Rio de Janeiro com quatro anos. Fui professor durante 50 anos.

 

Quem foram seus pais?

 

CD: Humberto Dottori e Dolores Maria Guilhermina Bittencourt Dottori. Nenhum dos dois tem formação superior. Ele era filho de imigrantes italianos, ela filha de um coronel da Guarda Nacional, com todas as pompas e circunstâncias. Fui criado num ambiente de classe média.

 

Onde foram os seus primeiros estudos?

 

CD: Estudei numa escola primária perto de casa. Depois no Colégio Arte e Instrução em Cascadura. Depois fiz dois anos interno em Ponte Nova, interior de Minas. Vim para o Rio e fui para o Pedro II para fazer o ensino médio. Terminei o Pedro II, fiz a Faculdade Nacional de Filosofia. Era a unidade da Universidade do Brasil responsável pela formação de professores.

 

O senhor se especializou em que?

 

CD: Fiz o curso de Geografia e História, porque os dois cursos eram juntos. Foi uma experiência muito rica. Era a década de 1950. A escola funcionava na Antônio Carlos onde hoje é o consulado da Itália. Todos os espetáculos do Municipal eram exibidos lá, porque nós tínhamos os melhores intelectuais do Rio daquela época. Eu vi Marcelo Marçot, Jean Villaré, o que havia de mais significativo. Foi realmente um período mágico. No final dos anos 50, a escola se politizou muito. Uma das escolas mais atingidas pela revolução de 64 foi a Nacional de Filosofia. Ela foi desfeita na reforma universitária. Cada um daqueles cursos foi agregado por outra unidade. Aí a escola se perdeu. Não há hoje mais uma instituição específica para a formação de professores.

 

Quando o senhor formou?

 

CD: Em 1957. A partir daí comecei a dar aula. Sempre dei muita sorte. Sempre trabalhei nas melhores escolas do Rio.

 

Qual foi o seu primeiro contato com o Colégio Andrews?

 

CD: Meu primeiro contato foi com uma colega de turma, minha ex-mulher, que foi aluna do Andrews. Foi uma aluna brilhante do colégio.

 

Como ela chama?

 

CD: Ella Grinsztein. O Andrews era uma escola laica que abrigava a comunidade judaica. As primeiras famílias judias que vieram para o Rio não tinham uma escola onde se mantivesse a tradição da cultura judaica. Com isso, o Andrews foi durante muito tempo, por ser uma escola de qualidade e laica, o lugar que recebeu essa comunidade, e sempre com muito respeito e muito cuidado. Isso sempre foi uma marca da escola. Tanto que quando fui dar aula no Andrews, eu me apresentei ao professor Mota Paes, que era o coordenador do turno da manhã, e disse que era casado com uma ex-aluna. O comentário que ele fez foi que ela era uma excelente aluna.

 

Quando o senhor entrou para dar aula no Andrews?

 

CD: Em 1961. Eu trabalhei de 1957 a 1960 no Colégio de Aplicação, no Colégio São Bento e no Pedro II. Como eu casei com uma moça não católica o São Bento me demitiu. O Colégio de Aplicação, por uma questão interna, demitiu três professores: Manuel Maurício, Artur Weiss e eu. Com isso, o irmão do Artur, o Hugo Weiss, que tinha sido convidado para ser coordenador do Andrews, sabendo que eu tinha casado e estava sem emprego, me chamou para dar aula no colégio. Na verdade, ele dividiu a carga horária comigo.

 

Ele também era professor de Geografia?

 

CD: Ele se formou comigo, mas dava mais aula de História. Trabalhei no Andrews em 1961, 1962, 1963. Quando aconteceu o golpe em 1964, eu já não estava mais no Andrews. Depois disso fui convidado a trabalhar no Colégio Santo Inácio.

 

Quando o senhor entrou em 1961, deu aulas para que turmas no colégio?

 

CD: Comecei a trabalhar nas turmas de Ensino Médio. Dava aula basicamente nas turmas do Clássico, junto com o Maurício Silva Santos.  Em 1962, com a reforma de ensino, eles criaram classes experimentais.

 

O senhor deu aula para as classes experimentais?

 

CD: Dei tanto no Ginásio quando no colegial. Trabalhei dois anos com essas turmas experimentais.

 

Como foi essa experiência?

 

CD: A turma do Ginásio era excepcional. Era um grupo grande de rapazes com apenas três moças, entre elas a Regina Andrews, neta da Isabel Andrews, fundadora da escola. Eu dava aula de Geografia e o José Luís Werneck da Silva dava aula de História.

 

Era muito diferente a classe experimental da classe tradicional?

 

CD: As turmas eram menores, o que permitia um contato mais próximo com o professor. Nas turmas normais tinham uns 40 alunos dentro de sala, já nas experimentais tinham 30. Na dinâmica na sala de aula acho que não havia muita diferença. Nós ainda éramos jovens e éramos vistos como os professores que estavam renovando. Com a turma da tarde fomos ao Pico de Itatiaia no inverno, estava tudo gelado. Com a turma de terceiro ano fomos à Álcalis, em Cabo Frio. Tínhamos uma forma diferenciada de trabalho e isso dava o tom.

 

De uns tempos para cá muitas escolas fecharam, o que o senhor acha que o Andrews tem que vai fazer 90 anos em 2008?

 

CD: A escola tinha um núcleo de professores que dava o tom. Eles eram referência pelo brilho pessoal, pelas aulas que davam. No primeiro ano que trabalhei no Andrews, o professor Flexa Ribeiro ainda era Diretor. Depois que ele assumiu o cargo de secretário de educação, ele se mantinha curiosamente a distância, mas controlava a escola inteira - professores, alunos, famílias - conhecia todo mundo pelo nome. Era impressionante a relação que ele criava. Tinha um grupo de diretores de primeiríssima qualidade: Aluísio, Mota Paes, Osmar, Guilhermina. Havia  o tesoureiro da escola, Carlos Guimarães, flautista excepcional de música erudita. Na portaria da escola tinha um senhor [Zuza], mas quando entrei já era o filho dele que estava assumindo, o Paulinho. Na secretaria tinha uma senhora chamada Alba, que acho que era prima do Edgard Azevedo. Todos muito competentes, cada um no seu setor. Isso é uma marca da escola. O espaço meio escasso e quando o colégio mudou para o prédio novo acho que foi um salto de qualidade.

 

Qual foi a importância do Colégio Andrews em sua vida?

 

CD: Quando fui professor do Andrews, eu tinha entre 23 e 26 anos, ainda muito impulsivo. O que mais me marcou no Andrews foi ter encontrado alguns professores como o Motta Paes, o Aluísio. Pessoas de uma retidão de atitude, de posição como professor. O que mais me marcou foi encontrar pessoas que podiam claramente ser tomadas como referência de vida. Alunos muito bons. Foi uma passagem muito rápida, foram três anos em 50, foi um período muito curto.

 

Dessas pessoas que o senhor encontrou no Andrews, alguma delas teve uma presença marcante?

 

CD: O Alcides Lourenço Gomes, professor de Biologia, uma pessoa com um conteúdo extraordinário. Eu aprendi muito conversando com ele. O Alcides foi um professor de mão cheia. Os bons alunos gostavam muito dele. Embora ele não desse uma aula dinâmica, mas o conteúdo era tão rico, que isso era suficiente para prender a atenção. Alguns professores do Andrews foram muito marcantes. Havia um professor de Filosofia, Penna, esse era uma das referências do colégio, era um homem fisicamente muito bonito, e era professor da UFRJ e da UERJ. O que mais me marcou no Andrews foi ter contato com essas pessoas. Alguns professores eram referências no Rio de Janeiro e nós convivíamos na sala de professores. Isso me marcou muito. Aquela escola tinha realmente peso acadêmico.

 

O senhor se lembra de alguns ex-alunos?

 

CD: O senador Agripino Maia foi aluno. Gostaria de fazer um comentário sobre o professor Flexa Ribeiro. A passagem dele na secretaria de educação foi muito curiosa porque ele, diretor de uma escola particular, aumentou brutalmente o número de matrículas nas escolas públicas. O argumento dele era que a escola particular de qualidade não sofreria nenhum impacto, mas que era necessário dar à população uma escola pública de qualidade. Isso dito por uma pessoa dona de uma escola particular era de um antagonismo visível. Durante a administração dele, todo ano havia concurso para professor do Estado da Guanabara. E os melhores professores da cidade do Rio de Janeiro foram lecionar no Estado, o que garantia que as escolas tivessem um padrão de qualidade. Na administração do professor Flexa Ribeiro havia uma política clara, definida.

 

Muito obrigado pelo seu depoimento.

 


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