Demétrio Nicolau

Projeto Andrews 90 anos

Entrevista com Demétrio Nicolau

Rio de Janeiro, 25 de setembro de 2007

Entrevistadora Regina Hippolito

 

Onde e quando você nasceu?

 

DN: Nasci em Buenos Aires, no dia 27 de setembro de 1951. Nasci lá por acaso, meu pai estava trabalhando. Voltei ao Brasil com nove meses e nunca mais voltei à Argentina.

 

Quem foram seus pais?

 

DN: Meu pai, Demétrio Nicolau, é romeno. Minha mãe é brasileira, carioca, seu pai foi engenheiro, construiu um porto no Espírito Santo, fez rodovias. Meu avô paterno, na Romênia, era comandante de navio.

 

Onde você fez seus primeiros estudos?

 

DN: Em Santa Teresa, onde fomos morar quando chegamos de Buenos Aires. Estudei no Educandário Menino Jesus. Fiquei nesse colégio até a terceira série do primário. Depois nos mudamos para Laranjeiras e eu vim estudar no Andrews da Visconde de Silva.

 

Em que ano?

 

DN: Em 1961 ou 1962.

 

Fale um pouco dessa época na Visconde de Silva.

 

DN: Eu me lembro da aula de uma professora do Admissão. Ela era uma contadora de histórias. Eu era bom aluno, ficava no pátio brincando enquanto outros alunos tinham aula de recuperação, mas subia para assistir a aula de contação de história. Era o que eu gostava mais. No primeiro ano, já na Praia de Botafogo, lembro de ter tido aula de Canto Orfeônico com a Julieta. Nas férias minha voz mudou e passei da primeira para a quarta voz. As salas eram arrumadas em quatro colunas e   sentávamos por voz. Os meus amigos estavam todo na quarta voz e eu, no primeiro semestre, sentado com o pessoal que falava fino. As meninas eram a segunda e a terceira vozes. Gostava muito de esporte, joguei futebol, basquete e vôlei. Com isso, meus estudos foram piorando. No primeiro ano passei meio apertado. Depois que fui reprovado, no terceiro ano, passei a sentar na primeira fila, a ajudar os professores a escrever no quadro. Comecei a prestar atenção em aula para não ter que estudar em casa. Entrei para o Teatro na terceira série do Ginásio.

 

Quem estava dirigindo o teatro do Andrews (TACA) nessa época?

 

DN: José Alfredo Zaza D’Aulísio, que tinha sido aluno. O TACA começou com o Roberto de Gleto. Fiz um teste para o Teatro, preenchíamos um formulário enorme. A primeira peça que íamos fazer não aconteceu. A segunda, no segundo semestre, saiu. Era hábito fazer duas peças por ano. Essa foi a minha estreia em Teatro, no dia 3 de outubro, há 40 anos. Ali foi a minha escola: trabalhei em 11 peças e montagens antes de começar a dirigir. Eu adorava, me interessava por tudo. Fiz de tudo: cortina, luz, cenário, aprendi a fazer maquete. Eu me interessava pelo todo.

 

Como se chama essa peça que vocês montaram no segundo semestre?

 

DN: Chamava-se “O macaco da vizinha”, de Joaquim Manuel de Macedo. Era uma comédia de costumes. O vizinho tinha arranjado um macaco, que invadia a minha casa e quebrava as coisas; enquanto isso, tinha as peripécias de dentro de casa, e eu andava com uma espingarda tentando matar o macaco.  

 

Alguma matéria do colégio ficou marcada para você?

 

DN: Eu tive bons professores de Matemática. No vestibular, me saí muito bem em Matemática, por conta de dois professores. O Maia, que é a minha lembrança número um, foi professor de minha mãe, era um senhor, tinha vigor, vitalidade. Depois fui aluno do Arimatéia, que era uma figura adorável. Isso já foi no curso Clássico. Outro professor que também marcou muito foi o Manuel Maurício, de História. Até onde eu ouvia, História eram dados, fatos e locais. Eu tive aula com ele até o vestibular.

 

Você fez vestibular para que?

 

DN: Para Administração de Empresas. Meu pai tinha um escritório, então, a princípio, fiquei dividido entre o teatro e o trabalho de meu pai.

 

Quando você entrou na faculdade, e em que faculdade?

 

DN: Entrei em 1972 na UFRJ. Nesse mesmo ano, comecei a dirigir o teatro do Andrews. Eu me formei em 1971 e o Edgar me convidou para dirigir as atividades extracurriculares: o Teatro, as olimpíadas, o jornal etc. As olimpíadas pegavam o colégio todo, fiz todos os tipos de modalidade, até xadrez e damas, para todos participarem.

 

Você acha que o colégio teve influência na sua escolha de profissão?

 

DN: Certamente. Ter feito Teatro no colégio, da forma que fiz e com as pessoas que fiz, me trouxe esse amor. Não posso chamar de profissão. Quando estou dirigindo é o natural, é a vida, o resto tudo apaga. Trabalho é o resto, é preparar projeto. Isso veio do Andrews, veio também do José Alfredo, que era uma pessoa que tratava o Teatro como uma coisa maior.

 

Queria que você me falasse um pouco sobre a sua direção no TACA.

 

DN: O professor Moraes, de Português, fazia umas montagens. Oficialmente foram as primeiras coisas que eu dirigi. Em um ano, ele fez Morte e Vida Severina e o Auto da Compadecida. Peças clássicas. Fiquei encarregado da montagem. Foi a minha primeira experiência de trabalhar com os colegas e dirigi-los. A partir de então, o Moraes passou a fazer essa atividade para o primeiro ano. Depois o Edgar me chamou para dirigir o Teatro, e entrei naquele esquema que eu conhecia do José Alfredo. Em 1972, assumi o TACA. Eu fazia um espetáculo no primeiro semestre, para o segundo grau e o ginásio, e outro no segundo semestre. Com isso, dirigi sete espetáculos em dois anos. Em 1972 e 1973, o colégio produzia uma montagem com tudo o que era necessário. A carpintaria do colégio construía o cenário, às vezes tinha escada, janela, porta, era trabalhoso, usava muito material. Eu alugava um caminhão de móveis, mobiliava as casas dos cenários. Mandava fazer roupas em duas ou três costureiras e alfaiates. O colégio oferecia um jantar de estreia. O Edgar sempre esteve presente. Eu tomava conta das contas. Fazíamos nove sessões de cada espetáculo. O colégio ia assistir e de noite vinham as famílias, os amigos. Era aberto, saía até no jornal como espetáculo de colégio. O ingresso custava o equivalente, hoje, a R$ 5,00. Esse dinheiro algumas vezes pagava essa produção toda, inclusive o jantar. Eu fazia a prestação de contas com o Carlos Roberto. A produção da peça, com tudo que era gasto, quase que se pagava totalmente.

 

Nessa época que você dirigiu o TACA já tinha essa infra-estrutura do teatro na Praia de Botafogo?

 

DN: Tinha. Eram poucos refletores, mas não se faziam luzes complicadas. Eu ainda peguei a iluminação com mesinha de manilha, com chumbo e água salgada, que fazia a resistência, porque não tinha resistência elétrica. O teatro dava toda a estrutura.

 

Na sua época o curso de teatro era de graça?

 

DN: Não era um curso, era uma montagem. Fazíamos testes com 40 ou 50 alunos e escolhíamos cerca de 15 que iam fazer a peça, além de contrarregras, maquiadores. Era um teatro amador com essa ideia de coletividade. E o colégio dava toda a estrutura.

 

Você se lembra mais de quem que trabalhou com você no TACA?

 

DN: O Miguel Falabella foi meu aluno de 1972 a 1974, era um bagunceiro. Lembro da Cristina Lacerda, quando eu ainda era do ginásio e ela já era mais velha. Na época do José Alfredo algumas pessoas chegaram a fazer televisão, como a Djenane Machado. O Falabella depois foi fazer o Tablado. Ele deve ter começado a dirigir o TACA em 1975, com a Maria Padilha.

 

Dessas sete peças que você montou, você se lembra de todas?

 

DN: Fiz uma comédia de costumes sobre o Rio dos anos 1920, chamava-se O bobalhão. Era a história de uma família bem engraçada. Fiz dois Martins Pena. Fiz O Natal na Praça, do Henry Gheón, que é uma peça profana sobre o nascimento de Jesus. Depois fiz um Lauro César Muniz que era meio político, falava da revolução de 1929, na época da ditadura. Fiz também um Noel Coward, uma comédia.

 

Você tinha total apoio da direção do colégio?

 

DN: Tinha. Eu não me lembro de não terem aceitado alguma peça, ou terem feito algum veto. Tudo que eu escrevia no programa eu mostrava sempre, mas nunca houve censura.

 

Você acha que o Andrews tinha uma relação diferente com o teatro?

 

DN: Sim, o Andrews tinha uma relação diferente das outras escolas com a cultura em geral. Havia dois ou três colégios que tinham Teatro, mas nenhum na época em que eu dirigi. Era um pioneirismo. Hoje se faz Teatro em quase todas as escolas, faz parte do currículo, mas antigamente não. Tanto que nos anos anteriores, de 1963 a 1965, ainda com Roberto de Cleto e José Alfredo, havia mostras em que participavam três ou quatro colégios e universidades, e geralmente o Andrews estava junto com universidades que tinham seu grupo de teatro.

 

Fale sobre a importância que o Andrews dava à cultura, à liberdade de escolha, etc.

 

DN: As atividades esportivas também eram muito fortes, era proporcionado ao aluno participar, todos jogavam alguma coisa. No Teatro, 40 pessoas por semestre ficavam envolvidas. Assistíamos filmes, os professores tinham incentivo para montar peças e organizar passeios, excursões.

As escolas preparavam e preparam muito mais o profissional do que o ser humano. No Andrews, o ser humano é mais bem construído em todas as áreas.

 

Você se lembra das pessoas que trabalharam com você no Andrews?

 

DN: Lembro-me do Miltinho, que era dono de uma livraria junto com a mulher. Tem o Paulo Sérgio Correia de Magalhães, um dos meus melhores amigos, tocamos juntos em conjuntos, fizemos esportes.

 

Qual foi a importância do Colégio Andrews na sua vida?

 

DN: O Colégio Andrews foi a minha vida. Estudei lá 10 anos e trabalhei dois. Conheci diversas relações, como aluno e como professor. Foi a minha educação, tudo o que aprendi conscientemente. Minha vida foi toda construída no Andrews, com aqueles professores, com aquelas pessoas, com aqueles amigos. Lembro-me do Vanderlei, que foi meu inspetor, e ainda o vejo quando passo na porta do colégio. Isso é uma família.

 

De uns tempos para cá muitas escolas fecharam. O que você acha que o Andrews tem que está resistindo ao tempo e vai fazer 90 anos em 2008?

 

DN: Foi um colégio construído por uma família. Acho que todos que passaram pelo Andrews falam com carinho do colégio. Agora, com essa reunião do colégio na Visconde de Silva, acho que vamos ter mais 90 anos pela frente.

 

Você pegou diferentes direções no colégio?

 

DN: Quando eu estudava, o doutor Carlos era o diretor. O Edgar foi  diretor depois. Tinha também o Carlos Roberto e a Verinha.

 

Você quer acrescentar alguma coisa?

 

DN: Eu sempre fui um sujeito de muitas atividades, fui sócio do Fluminense, vestia a camisa, tive turma de rua, de teatro; eu sou de vários lugares, dei aula em vários locais, com muitas turmas, mas o Andrews é sempre o centro, a base. Tenho um carinho muito grande. Por coincidência, vim morar ao lado do colégio. É impossível esquecer. 

 

Muito obrigada pelo seu depoimento.           

 

 


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