Edgar Flexa Ribeiro

Projeto Andrews 90 anos

Entrevista com Edgar Flexa Ribeiro/Diretor

Rio de Janeiro, 29 de novembro de 2007

Entrevistadora Regina Hippolito

 

Onde e quando você nasceu?

 

EFR: Nasci no Rio de Janeiro em 21 de março de 1940, na Casa de Saúde Arnaldo de Moraes em Copacabana. Meu pai, na época, morava na Avenida Atlântica, no edifício Himalaia.

 

Fale um pouco sobre a sua infância.

 

EFR: Não tenho nenhuma memória dessa fase de Copacabana. Minhas memórias mais remotas são de quando nos mudamos para a Rua Marques de Olinda, em 1942, quando nasceu meu irmão Carlos Roberto.

 

Como foram seus primeiros estudos? Quando você entrou no Andrews?

 

EFR: Entrei no Andrews com uns cinco ou seis anos de idade. Antes disso eu ia muito ao colégio com meu pai aos sábados. No Jardim de Infância tive como professora Dora Midosi May, que era uma gracinha de professora. Eu tinha paixão por ela.

 

Você se lembra de seus colegas dessa época?

 

EFR: Me lembro do Salvador Cícero Veloso Pinto, meu primo irmão, filho do irmão mais velho de minha mãe, foi meu colega até o quarto ano ginasial; nos separamos porque eu fui para o Clássico e ele para o Científico. Lúcia Beatriz de Azevedo, mãe de Gustavo Gasparani, que hoje toma conta do teatro do colégio foi a primeira paixão da minha vida. Logo depois do Jardim de Infância, entrou o João Cândido Portinari.

 

E de seus professores você se lembra?

 

EFR: Eu tenho nítida memória a partir da segunda série do primário. Tive no primário duas professoras de língua estrangeira, mademoiselle Margot Laje de Francês, e miss Mary de Inglês.  Depois fui aluno de outra professora que marcou a minha vida, dona Geni Araújo, na terceira série, ela foi uma revelação, eu ia para aula dela com uma alegria enorme, ele era muito carinhosa, era excelente. Na quarta série foi a dona Olga de Assis. E na quinta série tive como professora a dona Juraci Werneck.

No primeiro ano ginasial, me lembro muito bem de Mário de Assis, professor de Matemática, vulgo “caverinha”. Fui aluno de Malcássia de Aquino, Português; do Maia, em Ciências; dona Áurea de Moraes, de Inglês, que era irmã do professor Francisco Pimenta de Moraes. Marcou na primeira série ginasial a Guilhermina Sette como professora de Latim, grande professora. Na segunda série, fui aluno de Paulo Ronai, que tinha chegado recentemente ao Brasil, era húngaro, imigrado, e dava aula de Latim, era um espetacular professor. Na terceira série tinha o Maia novamente em Ciências. Na quarta série do ginásio tive como professor de Matemática o Miguel Ramalho Novo, que fazia parte da equipe de professores que veio da Escola Nacional de Química. Depois, no seu lugar entrou o Jorge de Abreu Coutinho, sobrinho dele, que foi professor de Matemática do colégio durante muitos anos; era um excelente professor, me abriu a cabeça para Matemática. Dante de Brito, professor de Inglês, também me marcou muito. Madame Jacobina como professora de Francês. Osmar Dias, professor de Geografia, que depois veio a ser coordenador do colégio, e trabalhou lá muitos anos. Antes, tinha sido meu professor de Geografia Alcías Martins de Ataíde.

 

 

Na época já existiam as classes experimentais?

 

EFR: Não. Quando a Lei Capanema (Lei 4024) foi votada, eu já estava na faculdade.

 

E de seus colegas do ginásio você se lembra?

 

EFR: Lembro-me de Paulo Terra, que tinha dois irmãos Carlos e Benjamim, Salvador Cícero, Leopoldo Shasqui, polonês; Rubem Paulo, que foi oculista, morreu moço, tinha um irmão chamado Guilherme; Joel, que hoje é advogado. Almir, Olavo, Violeta Buarque de Faria, inteligentíssima, era a craque da turma. No primário foram meus colegas dois meninos judeus que se tornaram muito meus amigos, Ilone Stareck e Paulo Kanter.

 

O fato de você ser filho do diretor foi problemático para você no colégio?

 

EFR: Como eu era meio distraído, não me marcou como problema.

 

Por que você escolheu o curso clássico?

 

EFR: Porque não gostava daquela Matemática toda.

 

Você tinha alguma definição profissional naquela época?

 

EFR: Não. Eu tinha muita facilidade com línguas, com História, com Geografia, com Estudos Sociais. Minha grande experiência foram as aulas de Filosofia com Antônio Gomes Penna, e as aulas de Português e Literatura com Joaquim Matoso Câmara Júnior, que foi o grande introdutor da linguística no Brasil. É um acadêmico respeitadíssimo até hoje.

Meu curso Clássico foi muito feliz porque ali eu fiz, pela primeira vez, um grupo de amigos muito próximos. Eu estava com 15 anos na primeira série. Em 1954 houve o atentado da Toneleros. Meu pai tinha sido colega do Carlos Lacerda na faculdade de Direito e me convidou para irmos visitá-lo. Ali conheci o Sebastião e o Sérgio, filhos do Carlos Lacerda. Talvez em função disso, o Carlos Lacerda tirou os filhos Sérgio e Sebastião do Colégio São Bento e os colocou no Andrews. Com eles vieram também o Gabriel Lacerda, filho do Maurício Lacerda, o Luís Buarque de Holanda, filho do Jaime Buarque de Holanda, irmão do Sérgio, e o Maurício Magnavita, filho de Fernando Magnavita, baiano, médico. Continuou comigo meu amigo do ginásio Sérgio de Abreu Fialho Nascimento Gurgel.

 

Quais professores do Clássico você acha que foram importantes?

 

EFR: Edgar Cabral de Menezes e Victor Maurício Nótrica, de Química, eram excelentes. O Eremildo Vianna era um estupendo professor de História, imbatível. Madame Jacobina, de Francês, Dante de Brito, de Inglês, Felisberto Carneiro, de Grego (matéria opcional), Salim Miguel, de Física. Tive aula de Espanhol com uma moça, que com seu marido foram os primeiros a acudir o major Rubens Vaz caído na calçada; Depois tive uma professora chamada Maria José Braga que me fez ler em Espanhol. Tive aula de Geografia com o Osmar Dias.

 

Era um número muito grande de matérias, não?

 

EFR: Era. Tinha Português, Francês, Inglês, Grego, Espanhol, História, Geografia, Filosofia, Matemática, Física e Química. A diferença para o Científico era que a Matemática existia em doses menores. Quando se tinha bons professores como o Edgar  Cabral de Menezes e o Vitor Nótrica, a abordagem ficava diferente, aula para o Clássico não era a mesma aula dada para o Científico, eles tinham essa sensibilidade. Saí do colégio para fazer faculdade de Direito na PUC.

 

Como era a preparação para o vestibular naquela época, tinha um curso?

 

EFR: Não tinha nada, acabava o terceiro ano e fazia a prova. No ano em que eu fiz a prova, o colégio teve um resultado muito expressivo no vestibular da PUC, que não era tão puxado como o da Nacional, mas não era fácil. O Gabriel foi primeiro lugar, o Salvador Cícero foi segundo, eu fui quinto, o Luís foi sexto colocado. Todos com excelentes notas de Português. Tinha prova escrita e exame oral, os examinadores da prova oral corrigiam as provas escritas. Eu passei com 10 na prova escrita e 10 na prova oral de Português.

 

 

 

 

Por que Direito?

 

EFR: Na época, eu queria ser diplomata e o curso de Direito ajudava a fazer o exame do Instituto Rio Branco.

 

Fale um pouco da sua época de faculdade.

 

EFR: Entrei na PUC em 1958. Eu não estava preparado para tudo aquilo, estava imaturo e acabei sendo reprovado em Introdução à Ciência do Direito. Fiz o primeiro ano de novo em 1959 e o segundo em 1960. No final do ano de 1960 teve a eleição para o primeiro governador do estado da Guanabara. Eu estava indo para o terceiro ano de Direito em 1961, quando em abril fui convidado para trabalhar no Palácio da Guanabara com o Rafael de Almeida Magalhães. Essa foi uma experiência vital na minha vida, valeu quatro universidades com doutorado. Em agosto o Jânio Quadros resolve renunciar, fiquei trancado no Palácio Guanabara, perco minha segunda chamada das provas, me desinteresso inteiramente da faculdade e sou reprovado novamente.  Em 1962 refaço o terceiro ano.  Em 1963, termino o curso de Direito e me caso com  Adriana. E continuo trabalhando com o Rafael. Em 1966, fui chefe de gabinete do Luís Gonzaga Nascimento Silva na presidência do Banco Nacional de Habitação (BNH). Depois o Nascimento Silva foi para o Ministério do Trabalho e me convidou para coordenar o grupo que iria elaborar o projeto de lei que unificava os institutos de previdência.Em 1967 e 1968 chefiei o escritório da reforma administrativa no Rio a convite de Hélio Beltrão, então ministro do Planejamento. No final de 1968 pedi demissão e voltei ao colégio para trabalhar com o Edgar Azevedo.

 

Na sua volta ao Andrews em 1969, você assumiu o que no colégio?

 

EFR: Quando eu estava no curso Clássico, trabalhei na contabilidade com a dona Eunice, que fazia secretaria escolar e tesouraria, e com o Carlos Guimarães no departamento de pessoal. Ele me ensinou a fazer folha de pagamento, calcular repouso remunerado, descontar INSS. Em 1969, voltei para trabalhar na Direção. Nessa época, o Edgar Azevedo era o diretor e meu pai era deputado e estava nas vésperas de ir para a UNESCO. Comecei a reencontrar meus professores Aluísio Machado, João da Motta Paes, Alcides Lourenço Gomes, Ernesto Tomasquin, o pessoal do Científico, Gildásio Amado etc. E fui começando a olhar o colégio já como Diretor. Estava despreparado, não tinha formação em Pedagogia ou Administração Escolar. Fui aprendendo na prática e sempre com a sensação que eu estava sendo aceito. A Guilhermina, Eunice, Guimarães e os professores pareciam me aceitar muito bem, nunca me senti imposto por ninguém.

 

Quando você saiu do colégio como aluno seu pai era Diretor, quando você volta como profissional o Edgar Azevedo era o Diretor, você achou que houve alguma mudança no colégio?

 

EFR: Não. As coisas mudavam muito devagar. Era o mesmo colégio, só que eu era mais velho, os alunos eram mais moços, foi uma época de muita mudança, o mundo mudou consideravelmente.

 

Muitos professores colocaram que na época da Direção do seu pai o colégio tinha uma linha mais humanista, o que você acha?

 

EFR: Isso tem a ver com a mudança dos vestibulares. O Colégio tinha que atender também aos alunos que o procuravam para fazer Medicina, Engenharia etc. O instrumental disponível na época era o convênio com os cursinhos. O Edgar Azevedo não quis fazer convênio. Ele achou outra solução. Alugou salas no prédio em Copacabana onde funcionava o Curso Vetor e o Curso Miguel Couto; naquelas salas só havia alunos do Andrews e ele transferia para os cursos uma parte da receita que aquelas turmas geravam.  Como os dois anos iniciais de Ensino Médio no Andrews eram muito fortes, eles não perdiam um minuto revendo matéria. As turmas eram divididas em função das diferentes carreiras para os vestibulares.

 

O que causou a ida do terceiro ano para a Visconde Silva?

 

EFR: O contrato de locação ia vencer em Copacabana. O vestibular unificado já estava no horizonte. Foi quando os cursos começaram a acabar e virar colégios.

 

Você volta em 1969 como assistente da Direção, e depois?

 

EFR: Quando o Edgar se afasta em 1972, meu pai volta formalmente para a Direção, com Aluísio Machado e João da Motta Paes como vice-diretores e o Carlos Guimarães como secretário. Quando ele foi para a UNESCO, os dois vices assinavam por ele, sob a minha gestão.Compramos então os terrenos na Macedo Sobrinho e fizemos a obra para instalar o Primário, dando espaço para crescerem as turmas de Ginásio e Segundo Grau na Praia de Botafogo. Depois fizemos o prédio dos fundos na Visconde de Silva e levamos para lá o terceiro ano do segundo grau. Em seguida foram as turmas de Ginásio e depois, em 2001, foi o restante. 

 

 

 

 

 

 

O fechamento do regime a partir do AI-5 se refletiu no colégio de alguma maneira?

 

EFR: No trabalho educacional não, refletiu no clima geral. Professores foram presos. O caso que eu me lembro mais de perto foi o do Manuel Maurício. Um oficial do Exército foi ao colégio pedindo as fichas dos professores, especificamente a do Manuel Maurício, com informações e posições ideológicas. Eu dei a ele a ficha do Ministério do Trabalho e disse que era a única que eu tinha e que nunca tinha tido nenhuma reclamação sobre ele. O Manuel Maurício foi preso e eu recebi uma intimação para ir depor no inquérito contra ele no quartel da Polícia do Exército na rua Barão de Mesquita. Eu chamei o Motta Paes para me acompanhar. Me perguntaram se o Manuel era comunista, eu disse: “não posso dizer nada, eu não tenho nenhuma queixa, o professor Manuel Maurício sempre deu aula, sempre foi muito querido pelos alunos, respeitado pelos seus colegas, nunca causou um problema para a Direção da escola, eu não tenho o que lhe dizer”. O oficial respondeu: “mas eu estou cheio de denúncias”. Eu falei: “eu não posso lhe ajudar nisso, se vieram denunciar aqui e não falaram comigo, o senhor sabe mais do que eu.”

 

Que profissionais você cita como relevantes para o Andrews?        

 

 O Antônio Carlos Amaral Azevedo, que foi Coordenador Geral na Praia de Botafogo. Na Visconde de Silva, a Ana Belisans, a Maria Alice Simonsen, a Marisa Fiúsa de Castro. E também a Eloni, a Adélia Carregal, o Rogério Carvalho e Silva que foi vice-diretor. Não posso deixar de falar em Marília Rodrigues, professora de Artes Plásticas, gravadora, uma grande figura no colégio. As excelentes professoras Iara Andrade no Pré-Escolar, Magda Fonseca e Ângela Vieira no Jardim de Infância e na Classe de Alfabetização, a Maria Helena Bumachar, a Gilda Freitas, Coordenadora do Primário, o George Miguel, a Regina Andrews, neta da mrs. Andrews, a Sheila Ponce Valente, a Liane Spolidoro Gonzalez, a equipe de orientação educacional do segundo grau era fantástica com Lea Malogonovisk, a Maísa Lacerda Freire, a Maria Helena Bulcão Ianeli, a Chulamis Glat, a Luzia Trompieri. Esse time me ajudou muito. Foi uma época muito boa.

 

Você acha que hoje o colégio mantém essa qualidade do corpo docente, porque o Andrews sempre foi famoso pela qualidade de seus professores?

 

EFR: O colégio sempre teve professores de muito bom gabarito. O professor no Andrews sempre foi muito respeitado. A atitude do colégio em relação aos seus professores é de absoluto respeito.

 

 

 

Fale um pouco do lado cultural do colégio, do teatro do Andrews, o TACA.

 

EFR: O TACA, os festivais de música, foram de uma época dos anos 1970 de grandes dificuldades para as atividades culturais. Não havia muitas opções e o nível de politização era intenso. O ambiente escolar por ser múltiplo, diversificado, não ter nenhum tipo de tonalidade político-ideológico, nem partidário, foi muito bom porque refloresceu nos garotos uma atitude muito positiva. Foi um sucesso. Começou com as Artes Plásticas nas classes experimentais. A Maria Thereza Wundheiler foi uma professora maravilhosa e a Marília também.  A Semana Ocupacional iniciada pela Lea. O Frejat e o Léo Gandelman se promoveram nos festivais do colégio.O teatro começou no colégio pela mão da madame Jacobina, com o Cercle Molière. Eu poderia ter sido ator. Fui do elenco da peça L’anglais tel qu’on le parle de Tristan Bernard. Depois da estreia na Praia de Botafgo fomos convidados para encená-la no Colégio Bennett, onde tinha palco de verdade, e fizemos um sucesso estrondoso.Quando vieram as classes experimentais, o Roberto de Cleto começou a fazer um teatro escolar. Ele formou o João Carlos D’Aulisio, que continuou o trabalho. Depois veio o Demétrio Nicolau. E aí veio o Miguel, que tinha sido ator com o Demétrio, e explodiu o TACA. Formou-se uma geração de atores e atrizes que me impressiona: Miguel, Maria Padilha, Teresa Seblitz, Bruce Gomlesvky, Marisa Monte, Gustavo Gasparani. Isso vai ficar por gerações.

 

Era uma coisa que também diferenciava o Andrews, porque os outros colégios não tinham teatro, não?

 

EFR: Não tinham teatro nenhum. Isso dava um diferencial para o Andrews. A disposição que o Andrews tem de agregar esse tipo de atividade ainda é algo que faz bem.

 

 O Andrews ainda aposta nessa parte cultural?

 

EFR: Aposta pesado. E tem sido um êxito constante.

 

Edgar, muito obrigada pelo seu depoimento.


 


« voltar

COLÉGIO ANDREWS

(21) 2266-8010

Endereço:
Rua Visconde de Silva, 161
Humaitá CEP 22271-043
Rio de Janeiro - RJ

Colégio Andrews
Todos os Direitos Reservados
@ 2017